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sábado, 14 de dezembro de 2024

Passe verde ferroviário. O primeiro teste.

Dezembro, dia frio. Após almoço decidiu-se rever a estonteante e maravilhosa linha da beira baixa, entre as estações de Entroncamento e Vila Velha de Ródão. 

Reserva de lugar para o InterCidades (IC) Lisboa - Guarda que, devido a greve, suprimiu as composições entre Lisboa e Entroncamento e fez partir dessa cidade um comboio á antiga, tipo urbano. Indicações de locais de partida contrárias: a app da CP indicava uma linha e os painéis eletrónicos da estação outra. A CP no seu melhor.

Sem ninguém no comboio, carruagens vazias, foi preciso confirmar com um revisor conhecido que aquele era efetivamente o comboio desejado.

Viagem até Abrantes com belas vistas para o Tejo, mas zona já batida. Pouco depois de Alferrarede, após novo atravessamento do rio, agora para a margem norte, começa a passar pela janela um cenário deslumbrante: o vale do Tejo, mais a montante, entre Abrantes e Vila Velha de Ródão, junto á fronteira espanhola. O comboio segue sempre a meia encosta, por vezes rasando a água, na margem direita do Tejo e permite observar zonas completamente desertas de população humana na margem sul. Entre Belver e alguns quilómetros a montante, observa-se a contornar o leito o serpentear de um passadiço, a rota da sirga. 

Chegada a Vila Velha de Ródão, a vila-aldeia. Aconchegada ao rio Tejo, acolhe as Portão de Ródão, área classificada no âmbito da conservação da natureza. Como refere o sítio internet do município, trata-se de uma imponente garganta escavada pelo rio Tejo na crista quartzítica da serra do Perdigão, que criou um estrangulamento no curso da água com 45 metros de largura. O local serve de habitat para a maior colónia de grifos do país e é um lugar privilegiado para a investigação de fauna e avifauna.
Regresso no final do dia, com o ângulo dos raios solares a pjtarem de outras cores as arribas do Tejo. Comboio com baixa ocupação, um pouco mais que na ida, chegou num ápice ao Entroncamento.

Término da primeira viagem com uso do passe verde. Que venham outras. 

terça-feira, 15 de agosto de 2023

CABRĀO

CABRĀO. 
Rio Cabrāo.
Nada de vernáculo. Somente toponímia: simultâneamente linha de água e localidade.
Rio Cabrāo não se deixou intimidar com a vergonha do nome, ao contrário de Constância e de Amadora. Acolhe bem os seus visitantes, atraídos pelas exuberantes cascatas do dito rio, afluente do Lima. Um pequeno percurso pedestre de cerca de 600 metros, ascendendo 150 metros, permite atingir o extenso rochedo constantemente afagado pela água, em menor quantidade neste quente verão.
 Após percorrer veredas, túneis de vegetação, escadas em madeira, passadiços e penedos, atinge-se uma pequena plataforma em madeira sobre a base da cascata. Para jusante, o vasto vale do Lima, abperderbde vista lá para os lados da serra Amarela, pintado de verde mais intenso pelas últimas e recentes chuvas e com uma mancha branca, fumo resultante de um incêndio florestal, em segundas núpcias, depois de abandonado prematuramente. 
Lá longe, na outra margem, o cibilar dos altifalantes da igreja de Santa Cruz do Lima, no dia da festa anual, concorria com o rumorejar da água e o canto da passarada. 
A cascata merece certamente um regresso, na estação fria, com mais água e sem a poluição dos sistemas sonoros dos campanários.


domingo, 3 de janeiro de 2021

Encontros ao longo do trilho de Jans - Nisa

     

- Olá, bom dia. É para visitar o Castelo?

- Quando quiser é só dizer. Eu abro-lhe a porta.   

Apercebi-me que o interlocutor, que surgiu do nada logo após ter estacionado o meu carro na praça central da aldeia, junto à velha mas imponente  fortaleza, era nem mais nem menos do que o funcionário do posto de turismo e também responsável pela abertura, fecho e manutenção do interior do Castelo.

Informando-o de qual era o meu  objetivo,  entregou-me diligentemente cartografia  do local e orientou no sentido do início do percurso pedestre de Amieira do Tejo.

Como qualquer bom percurso numa manhã fria de nevoeiro, o início tem de resvalar para um local onde sirvam café, neste caso a associação recreativa local. Após saborear a desejada bica, de forma mais apressada e decidida do que o vizinho  de balcão cujo copo de três era sorvido lentamente, iniciei o PR 1 - trilho de jans, circular, com cerca de 11 km, em direção ao rio Tejo. Primeiro ao longo de uma paisagem ondulada, remendada com pastagens luxuriantes, carvalhais e olivais, em direção ao banco de nevoeiro que se vislumbrava lá em baixo, no vale. Curiosamente, com o avançar do percurso e  da manhã, a neblina foi-se dissipando, qual mar vermelho aberto por Moisés, e deixava observar paisagens magníficas e feéricas. Percurso atapetado de musgo e herbáceas brilhantes de orvalho e uma constante presença invisível dos dedicados javalis que insistiam em interromper o referido tapete verde. Prados com gado ronceiro e curioso, mantido por pastores modernos, cavalgando veículos 4x4 mas não deixando de, diligentemente, oferecer o seu pequeno-almoço a um estranho que,  incompreensivelmente trocou o quente dos lençóis por um esforço matinal com temperaturas próximas do zero.

Até que, no início da abrupta descida para o rio, protegida por uma confortável e salvadora escadaria em madeira, surge, entre o nevoeiro esfarrapado, o maravilhoso e profundo vale do Tejo, com a barragem do Fratel unindo as suas margens, e a linha de comboio, rio abaixo e rio acima, de braço dado com o leito do rio mais extenso da península ibérica.

A chegada à margem do Tejo caudaloso, alimentado pela descarga de superfície da  barragem, permitiu conhecer pela primeira vez o extenso muro de sirga que parecia  concorrer com a linha da Beira Baixa, na outra margem. Não me recordo de alguma vez, nas longínquas infância e adolescência, ter ouvido falar destas estruturas de pedra, nalgumas zonas autênticas muralhas, que serviram em tempos idos para dar a força necessária aos barqueiros, através de cabos de sirga, para transporem as zonas mais caudalosas que o vento ou os remos não permitiam contrariar. E eram os animais ou a força humana, esticando esses cabos, que permitiam que as embarcações chegassem ao bom porto de Vila Velha de Ródão ou a terras de Castela.

E o percurso continuou, sempre acompanhado do rumorejar das águas revoltas,  dos saltos dos riachos em pequenas cascatas que se fundiam com o Tejo, do piar da diversificada e irreconhecível passarada e do voar atabalhoada das garças.

A passagem de uma locomotiva de manutenção pela linha da Beira Baixa, cujo maquinista acenou de forma simpática, quebrou momentaneamente a paz daquela tranquila paisagem rural.

Chegada à margem oposta de Barca da Amieira, local de transposição do curso de água com recurso a uma barca moderna e motorizada, verificou-se estar esta inoperacional devido aos mais de  430 m3/s golfados pela barragem. Barca da Amieira foi em tempos o local de passagem do corpo da rainha santa Isabel, falecida em Estremoz e sepultada na famosa igreja de Coimbra.

Na reta final do percurso, no remontar ao povoado de  Amieira do Tejo, o trilho passava inesperadamente por uma zona de acesso interdito, por ser privada. No entanto os  caminhantes, como afirmava a placa  informativa, eram bem-vindos e o seu acesso era feito por uma porta especialmente erguida para eles.

- Claro que sim. É sempre em frente, pelo caminho de terra batida - informou sorridente um trabalhador da quinta depois de lhe ter perguntado, timidamente, se podia passar.

Para trás ficava a deslumbrante paisagem pastoral do vale do Tejo.

Antes de entrar no troço alcatroado, surgiram dois pontos saltitantes que desciam encosta abaixo, por entre a vegetação esparsa e a transbordar de clorofila. Com a aproximação apercebi-me serem duas raposas, com suas causas farfalhudas, que, alegremente, à medida que avançavam, se desafiavam e mordiscavam.

Com o castelo ao fundo, entre as casas brancas e rasteiras da aldeia, ocupado em tempos pelo condestável D. Nuno, a estrada, murada, serpenteava pelo meio dos campos. Os condutores dos automóveis que, pontualmente, nela passavam, cumprimentavam. No percurso de regresso, os mesmos condutores insistiam na saudação cordial e calorosa.

Cerca de 4 horas depois, de chegada novamente ao largo do castelo, este já se encontrava fechado e o amável funcionário camarário, por ser a sua hora de almoço, já tinha interrompido o corte de vegetação no seu interior, sempre de olho no balcão do posto de turismo, também da sua responsabilidade.

Percurso terminado mas não concluído: em  abril será retomado e repetido, recorrendo então ao comboio até à estação de Barca da Amieira- Envendos e posterior passagem do concelho de Mação para o de Nisa utilizando o denominado transbordador. E vai haver certamente uma paragem, pela hora do almoço, na associação recreativa onde, com mais calma, poderemos certamente saborear uma bifana e um copo de três, quiçá acompanhado pelo tal habitante de Amieira do Tejo.

Estão convidados.


RN, 3jan2021