domingo, 27 de junho de 2021

Choco frito no interior


Todos nós já percebemos que nem sempre a origem do produto é garante de melhor confeção gastronómica. As pizzas são melhores nos Estados Unidos do que em Itália e o polvo ou o bacalhau são mais saborosos no interior do que no litoral.

Por isso nada de espanto quando em Pedrógão (sim Pedrógão, nas faldas da serra d'aire) se degusta um choco frito de nível idêntico ou melhor do que o setubalense. A experimentar. 

Sai um "chouque frrite" à pedroguense no restaurante "Vamos Ver" !

(entretanto e infelizmente já encerrou... 😑)

domingo, 6 de junho de 2021

Andar pelo mar




A greve dos ferroviários impossibilitou a usufruição do PR Mação(#PR4MAC), conforme previsto. Na véspera a APP CP recusou-se a emitir o bilhete pelo motivo referido. 

Alternativa mais perto de casa, no sentido oposto e sem recurso ao comboio: o polje de Minde. Durante a época de maior pluviosidade, esta área, confinada pelo planalto de Santo António, Serra Daire, Mira Daire e Minde, fica alargada e constitui o denominado "mar de Minde" onde se pode observar uma curiosa ondulação. Nesta altura, às portas dos meses estivais, a vasta superfície de água dá lugar a lagoas dispersas, que sustentam a biodiversidade do ecossistema. A variedade florística é enorme, e evidente o predomínio do pilriteiro, uma árvore de pequeno/médio porte com folha caduca, ramos espinhosos, pequenas flores brancas da família das rosáceas e bagas comestíveis de um vermelho vivo semelhante a maçãs minúsculas. Constituem túneis frescos, de dezenas de metros, nos percursos efetuados. 

O polje está polvilhado de vários troços de trilhos (PR10-ACN e PR12-PMS) que podem ser utilizados alternadamente. Neste domingo estavam intensamente ocupados por, provavelmente, habitantes das povoações da zona, que os percorriam a correr, de bicicleta, a cavalo, de mota e a andar. Um autêntico circuito de manutenção da zona. 

Em pleno Parque Natural das Serra Daire e Candeeiros, este local tão peculiar e com paisagens díspares, merece uma visita, de Verão ou de Inverno . 

Uma boa oportunidade para dizer que andámos sobre o mar, quão Moisés. 

Cerca de 11km percorridos calmamente em 2 horas e 40 mn, com pausas frequentes para apreciar a paisagem, fotografar e beber um café. 1400 kcal gastas e que serão facilmente repostas com o valente cozido à portuguesa que nos espera ao almoço. 😜 













segunda-feira, 17 de maio de 2021

PR1 - arribas do Tejo

                                             

 - Senhores passageiros. Vai sair da linha número 2 o comboio regional com destino a Castelo Branco, com paragem  em todas as estações e apeadeiros.

Estação do Entroncamento. 7h45mn. Despida de passageiros devido à preguiça dominical e à pandemia, a composição inicia ruidosa e lentamente o seu percurso. desliza pela Linha da Beira Baixa, uma das mais cénicas de Portugal. O primeiro lanço, de Abrantes à estação da Covilhã, entrou ao serviço em 6 de setembro de 1891, tendo a linha sido concluída com a inauguração até à Guarda, em 11 de maio de 1893, há 128 anos portanto.

Acabámos de passar pela estação de Alvega-Ortiga. Relembro as recentes notícias nos pasquins regionais dando conta da proposta da autarquia ortiguense de mudança de nome para Ortiga-Mação, porquanto a ligação com Alvega, na outra margem, já se perdeu, com o termo da travessia por barco e a menor dependência comercial e social daquela povoação.

- Senhores passageiros: próxima paragem,  apeadeiro da barragem de Belver. Uma indicação personalizada dado ser o único passageiro visível no comboio. Saída pelo cais sul, com acesso direto às instalações da estação; o cais norte  é... a esplanada do restaurante da Lena. Uma ótima opção para caminhantes que se fiquem pela viagem de comboio... 😁

Antes de iniciar o percurso pedestre entrei  no estabelecimento. Balcão de mármore, montra com  Kinder Bueno e pastilhas Gorila.

- Olá bom dia. (10sec). Bom dia, está alguém?
- Já vai. Só um bocadinho, estou na cozinha. 

Depois de conversar com a D. Lena e com o filho fiquei a saber que o restaurante só funciona por marcações e tem como especialidade a lampreia (só na época dela). Estava chorosa a D Lena: fazia anos que o marido faleceu. Ficou combinado, numa próxima caminhada, um almocinho. Refeição completa a bom preço, com uma atençãozinha caso não peça fatura.

A pequena rota 1, PR1, arribas do Tejo, circular, desenvolve -se pelas duas margens do Tejo, nos concelhos de Mação e Gavião. Inicia-se na praia fluvial de Ortiga, local balnear e de pesca desportiva, com as margens tingidas de branco pela invasora Zantedeschia aethiopica, o jarro ou o copo-de-leite como nome comum, muito apreciados pelas tradicionais donas de casa dos anos 60 e 70.

O percurso da margem norte, ou direita, apresenta desníveis suaves, exceto na fase inicial em que no extremo da ascensão se pode apreciar o troço do rio que vai da barragem de Belver até ao castelo com o mesmo nome e as arribas para o Tejo, que dão o nome ao trilho. Vários quilómetros sem  ver vivalma e onde os sentidos se concentram na explosão de cores primaveris, cheiros e sons claros e cristalinos da passarada, insetos e rumorejar da folhagem.


A vereda acompanha várias estremas de zonas de caça que, através das respetivas placas sinalizadores, traçam o percurso dos serviços florestais al longo dos anos: DGF, DGRF, AFN, ICNF. 

A entrada em Belver faz-se pelo norte, o que permite visualizar uma perspetiva deslumbrante do altaneiro castelo. O trilho acompanha uma linha de água profunda e com vestígios de infraestruturas de aproveitamento hídrico.

Já na povoação constatou -se, através de um lacónico aviso colado no vidro da porta do centro de saúde, que este se encontra encerrada em virtude do Dr. Cabaço se ter reformado..

Com a passagem da centenária ponte rodoviária sobre o Tejo, que sustenta a E244, começa o desassossego gerado pelos passageiros de múltiplas camionetas de turismo que têm como único objetivo transporem os escassos quilómetros de passadiço até à praia fluvial do Alamal. Apesar de, do troço de madeira, se observar  uma paisagem fulgurante para Belver e o seu castelo, é  de evitar este local, pelo menos ao fim de semana.

O troço final entre o Alamal e a barragem de Belver, pela margem sul, é uma autêntica montanha russa, vertical e horizontal, onde praticamente todo o percurso se desenvolve através de um agradável túnel vegetal que acompanha o rio Tejo a várias altitudes. A luxuriante, diversa e intensa vegetação, embora ainda a recuperar de recente incêndio rural, nada fica a dever à Laurissilva (desculpem-me a comparação, os colegas fitosociólogos puristas).


Foram cerca de 5 horas, 16 km palmilhados com alguma dificuldade e esforço. perfeitamente  compensado pela bonita paisagem, pelo isolamento relaxante e pelo café e a conversa da D.Luisa.. 

Adquirido fôlego, energia e oxigénio para mais alguns dias de teletrabalho e de máscara obrigatória.



domingo, 14 de fevereiro de 2021

Asterix poliglota


 


Numa passagem rápida pela FNAC comprei o último álbum de Asterix.
Quando cheguei a casa e me preparei para o saborear reparei que na capa, antecedendo o  nome do novo autor Ferri, surgia a palavra TESTO e, antecipando o nome do desenhista Conrad, constava a palavra DEZEINHOS.
Primeira conclusão apressada, com um sorriso de escarnio: então não é que estes gajos  da editora publicaram  uma impressão com erros?
Numa passagem rápida pelos quadrinhos do interior do livro constato que o texto estava escrito numa língua que não o português. -- Talvez espanhol, presumi sem grandes raciocínios. Mais um engano!!
Quando inicio a leitura cuidada e atenta da obra, como aliás faço com todos os álbuns destes nossos heróis, verifiquei que na página que mostra o mapa da Gália com o enclave dos irredutível gauleses rodeado por guarnições romanas constava o seguinte texto:
"Stamos an 50 antes de Jasus Cristo. Toda a Gália sta adominada puls romanos... Toda? Nó! Ua aldé chena d'eirredutibles gouleses rejiste inda e siempre al ambasor. I la bida num ye fácele pa las guarniçones de lhegionairos romanos de ls acampamientos..."

Quando sair o próximo álbum original faço questão de comprar, para além da versão em Mirandês, também o livro no dialeto Minderico.    ☺☺


domingo, 3 de janeiro de 2021

Encontros ao longo do trilho de Jans - Nisa

     

- Olá, bom dia. É para visitar o Castelo?

- Quando quiser é só dizer. Eu abro-lhe a porta.   

Apercebi-me que o interlocutor, que surgiu do nada logo após ter estacionado o meu carro na praça central da aldeia, junto à velha mas imponente  fortaleza, era nem mais nem menos do que o funcionário do posto de turismo e também responsável pela abertura, fecho e manutenção do interior do Castelo.

Informando-o de qual era o meu  objetivo,  entregou-me diligentemente cartografia  do local e orientou no sentido do início do percurso pedestre de Amieira do Tejo.

Como qualquer bom percurso numa manhã fria de nevoeiro, o início tem de resvalar para um local onde sirvam café, neste caso a associação recreativa local. Após saborear a desejada bica, de forma mais apressada e decidida do que o vizinho  de balcão cujo copo de três era sorvido lentamente, iniciei o PR 1 - trilho de jans, circular, com cerca de 11 km, em direção ao rio Tejo. Primeiro ao longo de uma paisagem ondulada, remendada com pastagens luxuriantes, carvalhais e olivais, em direção ao banco de nevoeiro que se vislumbrava lá em baixo, no vale. Curiosamente, com o avançar do percurso e  da manhã, a neblina foi-se dissipando, qual mar vermelho aberto por Moisés, e deixava observar paisagens magníficas e feéricas. Percurso atapetado de musgo e herbáceas brilhantes de orvalho e uma constante presença invisível dos dedicados javalis que insistiam em interromper o referido tapete verde. Prados com gado ronceiro e curioso, mantido por pastores modernos, cavalgando veículos 4x4 mas não deixando de, diligentemente, oferecer o seu pequeno-almoço a um estranho que,  incompreensivelmente trocou o quente dos lençóis por um esforço matinal com temperaturas próximas do zero.

Até que, no início da abrupta descida para o rio, protegida por uma confortável e salvadora escadaria em madeira, surge, entre o nevoeiro esfarrapado, o maravilhoso e profundo vale do Tejo, com a barragem do Fratel unindo as suas margens, e a linha de comboio, rio abaixo e rio acima, de braço dado com o leito do rio mais extenso da península ibérica.

A chegada à margem do Tejo caudaloso, alimentado pela descarga de superfície da  barragem, permitiu conhecer pela primeira vez o extenso muro de sirga que parecia  concorrer com a linha da Beira Baixa, na outra margem. Não me recordo de alguma vez, nas longínquas infância e adolescência, ter ouvido falar destas estruturas de pedra, nalgumas zonas autênticas muralhas, que serviram em tempos idos para dar a força necessária aos barqueiros, através de cabos de sirga, para transporem as zonas mais caudalosas que o vento ou os remos não permitiam contrariar. E eram os animais ou a força humana, esticando esses cabos, que permitiam que as embarcações chegassem ao bom porto de Vila Velha de Ródão ou a terras de Castela.

E o percurso continuou, sempre acompanhado do rumorejar das águas revoltas,  dos saltos dos riachos em pequenas cascatas que se fundiam com o Tejo, do piar da diversificada e irreconhecível passarada e do voar atabalhoada das garças.

A passagem de uma locomotiva de manutenção pela linha da Beira Baixa, cujo maquinista acenou de forma simpática, quebrou momentaneamente a paz daquela tranquila paisagem rural.

Chegada à margem oposta de Barca da Amieira, local de transposição do curso de água com recurso a uma barca moderna e motorizada, verificou-se estar esta inoperacional devido aos mais de  430 m3/s golfados pela barragem. Barca da Amieira foi em tempos o local de passagem do corpo da rainha santa Isabel, falecida em Estremoz e sepultada na famosa igreja de Coimbra.

Na reta final do percurso, no remontar ao povoado de  Amieira do Tejo, o trilho passava inesperadamente por uma zona de acesso interdito, por ser privada. No entanto os  caminhantes, como afirmava a placa  informativa, eram bem-vindos e o seu acesso era feito por uma porta especialmente erguida para eles.

- Claro que sim. É sempre em frente, pelo caminho de terra batida - informou sorridente um trabalhador da quinta depois de lhe ter perguntado, timidamente, se podia passar.

Para trás ficava a deslumbrante paisagem pastoral do vale do Tejo.

Antes de entrar no troço alcatroado, surgiram dois pontos saltitantes que desciam encosta abaixo, por entre a vegetação esparsa e a transbordar de clorofila. Com a aproximação apercebi-me serem duas raposas, com suas causas farfalhudas, que, alegremente, à medida que avançavam, se desafiavam e mordiscavam.

Com o castelo ao fundo, entre as casas brancas e rasteiras da aldeia, ocupado em tempos pelo condestável D. Nuno, a estrada, murada, serpenteava pelo meio dos campos. Os condutores dos automóveis que, pontualmente, nela passavam, cumprimentavam. No percurso de regresso, os mesmos condutores insistiam na saudação cordial e calorosa.

Cerca de 4 horas depois, de chegada novamente ao largo do castelo, este já se encontrava fechado e o amável funcionário camarário, por ser a sua hora de almoço, já tinha interrompido o corte de vegetação no seu interior, sempre de olho no balcão do posto de turismo, também da sua responsabilidade.

Percurso terminado mas não concluído: em  abril será retomado e repetido, recorrendo então ao comboio até à estação de Barca da Amieira- Envendos e posterior passagem do concelho de Mação para o de Nisa utilizando o denominado transbordador. E vai haver certamente uma paragem, pela hora do almoço, na associação recreativa onde, com mais calma, poderemos certamente saborear uma bifana e um copo de três, quiçá acompanhado pelo tal habitante de Amieira do Tejo.

Estão convidados.


RN, 3jan2021